O auto cuidado como estratégia de bem-estar na pandemia

Ninguém está bem e se tem alguém que diz que está ótimo, nesse momento que vivemos, está mentindo. Por isso, falar de autocuidado em plena pandemia do coronavírus, é preciso.

Nossas vidas e rotinas foram reviradas, bagunçadas e ficou difícil botar ordem nesse caos. Perdemos muito. Estamos em luto pelos que se foram.

Tivemos que aprender a viver sem muitas experiências de bem-estar. Longe de pessoas queridas, sem poder abraçar quem amamos nem estar com os amigos.

Cada um reagiu a isso de uma maneira única. Alguns entraram em desespero, outros buscaram a melhor forma de se adaptar a nova realidade, tantos negaram a gravidade da situação e tentaram seguir vivendo como se não fosse com eles. 

Diante das perdas e da ausência das distrações e afazeres que tínhamos antes da pandemia, tivemos que encarar o vazio, não só o vazio nas rotinas, na família, no círculo de amigos, mas o nosso próprio vazio.

O problema é que a gente foge do silêncio, dos nossos pensamentos, e esquecemos que os momentos de reflexão são importantes para o autoconhecimento.

Definhamento na pandemia

Segundo uma pesquisa da USP realizada em onze países, o Brasil foi o país com mais casos de ansiedade (63%) e depressão (59%) na pandemia.

“A pandemia de Covid-19 tem se mostrado um evento traumático para muitas pessoas, levando ao aumento exponencial de sentimento de medo e estresse.”

Para Adam Grant, psicólogo organizacional e escritor, vivemos um estado de definhamento na pandemia, diferente de depressão ou esgotamento. Uma sensação de pouca alegria ou objetivo, um sentimento de estagnação e vazio, como se estivéssemos vendo a vida se arrastar.

Se pensarmos a saúde mental como um espectro que vai da depressão ao florescimento, sendo este o apogeu do bem-estar, a depressão seria o mal-estar, onde você se sente pesado, esgotado e inútil.

O definhamento estaria no meio, segundo Adam. Ausência de bem-estar sem estar deprimido. O antidoto seria algo parecido com fluxo — um “fugidio estado de absorção em um desafio importante ou uma sensação momentânea, em que sua sensação de tempo, lugar e self se dilui.” 

O trabalho significativo, novos desafios e experiencias agradáveis seriam possíveis antídotos para o definhamento, mesmo que seja difícil encontrar fluxo quando você não consegue se concentrar.

Encontrar um tempo diário para se concentrar em um desafio ou um projeto que seja importante para você é um passo na direção de redescobrir a energia e o entusiamo que estão em falta ultimamente.

Tudo isso nos faz repensar a nossa compreensão de saúde mental e sua relação com o bem-estar.

Autocuidado, bem-estar e saúde mental

Autocuidado diz respeito a uma atitude ativa e responsável em relação à qualidade de vida. No dicionário, bem-estar é definido como o estado de satisfação plena das exigências do corpo e/ou do espírito. Sensação de segurança, conforto, tranquilidade.

O bem-estar é consequência do autocuidado. No entanto, precisamos ter cuidado com o autocuidado de farmácia. Skincare, compras, serviços em geral que vendem “a cura”. Como bem diz Ailton Krenak — somos seres de consumo transformando tudo em mercadoria.

A nossa sociedade valoriza o individualismo, a obsessão por saúde e por cuidar de si. Queremos comprar o nosso bem-estar. A gente busca essa sensação de segurança e conforto, fora de nós.

Queremos ter dinheiro para terceirizar a vida. Não queremos sofrer, nem ter trabalho. Pensamos que podemos comprar a felicidade.

O cuidado de si para estar bem

Para entender o auto cuidado em uma dimensão mais ampla, eu prefiro usar o conceito de cuidado de si, desenvolvido por Foucault, que tem a ver com a prática da psicanálise.

O cuidado de si se assemelha a psicanálise porque envolve a interpretação dos sonhos; a ideia de análise, ou seja, de que a vida pode ser analisada; nos convida a olhar as coisas de longe, para poder ver melhor de perto.

O cuidado de si, tem a ver com ocupar-se de si mesmo, com se preocupar consigo mesmo. Isso implica em converter nosso olhar dos outros e do exterior em direção a nós mesmos. Designa também ações exercidas para si, pelas quais nos modificamos. Ocupar-se de si sempre tem um sentido positivo.

Antes de Sócrates, o cuidado de si era comandado pelo princípio de uma existência brilhante e memorável, mas foi modificado e substituído pelo princípio de dizer a verdade.

Portanto, compreendemos o cuidado de si á luz da emergência da vida verdadeira no princípio e na forma do dizer a verdade aos outros, a si mesmo.

É importante lembrar que um discurso filosófico não coloca a questão da verdade sem se interrogar ao mesmo tempo sobre as condições de dizer a verdade. (estruturas políticas).

Isso nos convoca a pensar o cuidado de si não com um ato isolado e egoísta, mas algo que esta intimamente relacionado com o meio e com as circunstâncias em que vivemos.

O autocuidado, portanto não é uma tarefa simples, já que está permeada de fatores que influenciam esse processo: a nossa divisão/dualidade enquanto sujeitos, as estruturas externas, politicas ou de saúde publica, como a pandemia.

Ainda assim, não podemos esquecer que somos responsáveis por nossas vidas. Só a gente sabe — ou pelo menos procura saber — o que nos faz bem. O autocuidado, portanto, passa pela pesquisa de si, uma pesquisa sobre a verdade, a verdade sobre si.

Por isso, o cuidado de si, tem a ver com o que a psicanálise propõe, com o que se produz em uma análise, ou seja, a busca por revelar a verdade sobre o sujeito.

Faz sentido para você?

Se quiser saber mais sobre psicanálise ou marcar uma consulta, entre em contato comigo!

Publicado por Adriana Prosdocimi Psicanalista

Psicóloga e psicanalista. Consultas online — uma forma de atendimento que rompe as barreiras da distância, facilitando o acesso ao psicólogo, inclusive para os brasileiros que vivem no exterior.

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